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FRENTE NACIONAL CONTRA A PRIVATIZAÇÃO DA SAÚDE

AGENDA PARA A SAÚDE[1]

A Frente Nacional contra a Privatização da Saúde composta por diversas entidades, movimentos sociais, fóruns de saúde, centrais sindicais, sindicatos, partidos políticos e projetos universitários tem por objetivo defender o SUS público, estatal, gratuito e para todos, e lutar contra a privatização da saúde e pela Reforma Sanitária formulada nos anos 1980[2].
Os avanços alcançados com o Sistema Único de Saúde (SUS) nos seus 22 anos de existência estão ameaçados pela histórica correlação de forças entre os interesses do setor privado que defende a saúde como mercadoria e fonte de lucro, e os interesses dos setores progressistas organizados na sociedade civil que defendem a saúde como direito de todos e o seu caráter público. O SUS tem sido desvalorizado na sua raiz: o seu caráter público e o acesso universal. A lógica do fortalecimento do setor privado na oferta de serviços de saúde tem prevalecido por dentro do SUS, via aumento de contratualizações de serviços privados de saúde e repasse da gestão para entidades privadas, e no livre mercado, demonstrado pelo crescimento das operadoras de planos e seguros privados de saúde e de seus usuários.
A Frente retoma como fonte unificadora de lutas, a mesma motivação que deu sustentação às lutas travadas pelo Movimento Sanitário nos anos 1980: o combate à privatização da saúde, pondo em cheque os “novos modelos de gestão” – Organizações Sociais (OSs), Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIPs), Fundações Estatais de Direito Privado, Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares S.A – que promovem a entrega de patrimônio, bens, serviços, servidores e recursos públicos para entidades privadas. Entendemos que essa privatização ao transformar a saúde da população em mercadoria avilta o trabalho dos profissionais de saúde ao comprometer sua relação com os usuários do sistema, compromete a qualidade da atenção prestada a população e ameaça a concretização do direito a saúde.Todo sistema de saúde baseado na privatização apresenta custos crescentes e elevados agravados pela corrupção dos agentes privados que cobiçam o patrimônio público. 
A agenda da Frente Nacional contra a Privatização da Saúde apresenta algumas questões que dificultam a implantação do SUS público, Estatal, gratuito, universal e de qualidade e destaca algumas propostas para a garantia do direito à saúde[3], em cinco eixos estruturantes: Determinação Social do processo saúde e doença: saúde no contexto mais amplo das desigualdades sociais; Gestão e Financiamento da rede pública estatal de serviços de saúde; Modelo Assistencial que garanta o acesso universal com serviços de qualidade, priorizando a atenção básica com retaguarda na média e alta complexidade; Política de Valorização do Trabalhador da Saúde e Efetivação do Controle Social.

1)     Determinação social do processo saúde e doença: Saúde no contexto mais amplo das desigualdades sociais

Aponta-se a necessidade de resgatar o conceito de determinação social do processo saúde e doença tal como o Movimento de Reforma Sanitária. Isto vai implicar em inserir a saúde no contexto mais amplo das lutas para supressão das desigualdades sociais, com prospecção socialista, sem perder de vistas as mediações desse processo no cotidiano das práticas da saúde, ou seja, articular as lutas pela saúde às lutas por outra sociedade.
Existe uma tendência de análise em curso de minimizar o enfrentamento da referida determinação à diminuição das iniqüidades em saúde. Esta tendência é expressa no Relatório Final da Comissão Nacional sobre Determinantes Sociais da Saúde, de 2008, que reduz estes determinantes a um determinismo de fatores sociais, diferente da concepção mais ampla da Reforma Sanitária que relaciona o processo saúde e doença ao desenvolvimento das forças produtivas e as relações de exploração que existem na sociedade.
Neste sentido, apontamos como principais problemas para a implantação do SUS:
·         Redução dos princípios ético-políticos do Projeto de Reforma Sanitária, o que restringe a possibilidade de enfretamento efetivo das desigualdades sociais.
·         Manutenção do quadro de ampla desigualdade social nas condições de vida e saúde.
·         A subordinação das políticas públicas, sobretudo as sociais, à lógica macro-econômica de valorização do capital financeiro, restringindo os direitos sociais e ampliando o espaço do mercado.
·         Não viabilização da Seguridade Social, inscrita na Constituição Federal de 1988, que propõe uma política de proteção social universal, democrática e participativa.
·         Falta de articulação entre as três esferas de governo no que tange aos objetivos e diretrizes para as políticas de proteção social.

Propostas
  • Articulação da Reforma Sanitária a um projeto de transformação social de radicalização da democracia com real deslocamento do poder em direção às classes trabalhadoras, valorizando o conceito de consciência sanitária.
  • Concepção de saúde, enquanto dimensão essencial à vida, que considera os seus determinantes sociais e econômicos - a alimentação, a moradia, o saneamento básico, o meio ambiente, o trabalho, o acesso a terra para quem nela trabalha, a renda, a educação, o transporte, o lazer e o acesso aos bens e serviços essenciais (Art. 3º da Lei 8.080/90) -, relacionando à qualidade de vida da população. Para se ter saúde na sua plenitude exige-se uma Política de Estado comprometida com um modelo econômico e social que acabe progressivamente com as desigualdades sociais e com a destruição do meio ambiente, em função da acumulação de riqueza sem precedentes de uma minoria que detém o poder econômico e manipula o poder político.
  • Articulação e apoio às lutas vinculadas às condições concretas de saúde dos trabalhadores, como trabalho, educação, moradia, transporte, reforma agrária, entre outros.
  • Defender o serviço de saúde como serviço de relevância pública, não se constituindo como objeto de transação no mercado.
  • Mudança da política macroeconômica com a definição de uma política que garanta os direitos sociais através dos seguintes mecanismos:
§         Suspensão do pagamento da dívida e pela auditoria da mesma.
§         Apoio a campanha “A dívida não acabou e quem está pagando é você!”
§         Regulamentação do imposto sobre as grandes fortunas, como fonte para a Seguridade Social.
§         Contra a proposta de Reforma Tributária do governo. Por uma Reforma Tributária progressiva com manutenção do orçamento da Seguridade Social e suas fontes específicas.
§         Aplicação da CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido) para as instituições financeiras
Defesa da Seguridade Social possibilitando políticas sociais intersetoriais que assegurem os direitos relativos à saúde, assistência social e previdência social.
· Convocação da Conferência Nacional de Seguridade Social e recriação do Conselho Nacional de Seguridade Social.

2)     Gestão e Financiamento da rede pública estatal de serviços de saúde

Ressalta-se a tendência em curso do fundo público ser colocado a serviço do financiamento do setor privado, seja através da compra de serviços privados pela rede pública, por meio de convênios, em detrimento da alocação de recursos públicos na ampliação dos serviços públicos, seja através do repasse da gestão, patrimônio, bens, serviços, servidores e recursos públicos para entidades privadas com os denominados “novos modelos de gestão” – OSs, OSCIPs, Fundações Estatais de Direito Privado, Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares S.A. Tendência que está coerente com as recomendações dos organismos financeiros internacionais, dentro do programa de ajuste estrutural, de fortalecimento do setor privado na oferta de serviços de saúde. Neste sentido, as funções do Estado deveriam ser de co­ordenar e financiar as políticas públicas e não de executá-las, de acordo com o modelo de administração pública gerencial proposto, desde o governo de Fernando Henrique Cardoso, através do Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado (MARE).
A Frente compreende que os problemas existentes no campo da gestão do SUS não se resolvem através de “novos” modelos de gestão, mas assegurando as condições materiais necessárias para a efetivação do modelo de gestão preconizado pelo SUS. Isto implica na necessidade de mais recursos para ampliação dos serviços públicos com gestão pública estatal e controle social efetivo.


Problemas
·         Gastos públicos influenciados pela lógica do mercado e modelos gerenciais privatizantes.
·         Ampliação de serviços de saúde privados, e inserção de elementos de co-pagamento dentro do sistema público de saúde.
·         Transferência para o setor privado de atividades de interesse público, através de privatizações e terceirizações, entre outros mecanismos.
·         Introdução de mecanismos de competição dentro do setor público, com critérios de mercado.
·         Incorporação tecnológica indiscriminada e mercantilizada no Sistema Único de Saúde.
·         Dependência de preços elevados para o setor público, de equipamentos, medicamentos e insumos estratégicos para a saúde.

Propostas
·         Defesa dos princípios e diretrizes do SUS: universalidade, integralidade, intersetorialidade, participação social e descentralização. Combate a toda e qualquer tentativa de privatizar o SUS: OSs, OSCIPs, Fundações Estatais de Direito Privado e Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares S.A.
  • Aprimoramento do modelo de financiamento do SUS através das seguintes medidas:
a)      Financiamento que retome os princípios que regem o Orçamento da Seguridade Social.
b)      Defesa de aplicação, no mínimo, 6% do PIB para a saúde pública, garantindo a universalidade das ações e serviços de saúde.
c)      Extinção da renúncia fiscal para pessoa jurídica que presta assistência médica a seus funcionários.
d)      Acabar com a transferência de recursos públicos para o setor privado. Recurso público para o Serviço Público Estatal.
e)      Luta contra a manutenção da DRU (Desvinculação das Receitas da União de 20% dos recursos destinados aos setores sociais).
f)        Regulamentação da Emenda Constitucional 29, que estabelece critérios para financiamento dos serviços de saúde, integrado aos da Seguridade Social, assim, compatíveis com as necessidades sociais. Nos percentuais, exigir que a união aplique, em ações e serviços de saúde, no mínimo, 10% da corrente bruta e compromisso dos Estados aplicarem, no mínimo, 12% da receita de impostos, compreendidas as transferências constitucionais para a saúde.
g)      Eliminar o limite da LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal) para despesa com pessoal na saúde.
  • Ampliação do desenvolvimento tecnológico e inovação em equipamentos, insumos, métodos e processos de saúde pública, fortalecendo a capacidade reguladora estatal e social.
  • Fortalecimento do parque tecnológico público de produção de medicamentos e insumos em saúde, e do marco regulatório sobre as indústrias privadas, nacionais e multinacionais.
  • Ampliação da ação regulatória do Estado na iniciativa privada através dos mecanismos:
a)      Aumento do controle sobre a rede privada de prestação de serviços e garantia de que esta seja complementar ao setor público.
b)      Extinção de isenções fiscais para operadores e prestadores privados de serviços, planos e seguros.
c)      Abolir a renúncia fiscal para gastos com planos, seguros, aposentadoria privada e gastos com educação para pessoa jurídica.
  • Revisão dos modelos de gestão burocratizados, clientelistas e terceirizados para uma gestão pública com participação dos diversos sujeitos sociais, tendo como estratégias:
a)      Democratizar as instituições de saúde (criação de conselhos gestores e colegiado de gestão).
b)      Desmontar a lógica vertical e fragmentada das instituições de saúde.
c)      Garantir a transparência da gestão e do controle dos gastos.
d)      Romper com o isolamento no setor saúde através da criação de novos canais com políticas setoriais, infraestruturais, e com outras instâncias e poderes (sociedade, academia, poderes judiciário e legislativo).
e)      Investimento para a formação do “novo” gestor (critérios para este gestor: não ser indicado e sim eleito, ter responsabilidade sanitária e com gestão participativa, ser servidor público concursado).


3)     Modelo Assistencial que garanta o acesso universal com serviços de qualidade, priorizando a atenção básica com retaguarda na média e alta complexidade

Defende-se o modelo assistencial previsto no SUS constitucional que valoriza a prevenção e a promoção da saúde, a integralidade e a intersetoralidade das ações, na perspectiva de romper com o modelo, centrado na doença e subordinado aos interesses lucrativos da indústria de medicamentos e equipamentos biomédicos, descolado das necessidades da população que ainda é hegemônico.

Problemas
·         Modelo de atenção à saúde centrado na doença e focalizado, em detrimento das políticas de promoção e prevenção da saúde.
·         Incorporação tecnológica orientada pelas estratégias competitivas das indústrias lucrativas da saúde e não pelas necessidades da população.
·         Modelos de gestão burocráticos e verticalizados na organização dos processos de trabalho.
·         Estabelecimento de metas que não atendem à demanda da população.
·         Dificuldades de acesso universalizado e equânime aos serviços, insumos e medicamentos.

Propostas
  • Adoção do modelo assistencial centrado no cidadão de direitos. Ter como princípios a participação dos usuários no processo de promoção, prevenção e recuperação. Ampliar o acesso à atenção primária e nos demais níveis do sistema. Incrementar ações que possibilitem uma maior humanização, qualidade dos serviços e satisfação do usuário.
  • Implementação de um Modelo de Atenção à Saúde baseado nas necessidades de saúde e na perspectiva de atuação intersetorial.
  • Desburocratização das instâncias de negociação consensuada (comissões intergestoras), ampliando o caráter técnico e político, a transparência e o controle social.
  • Avaliação tecnológica com transparência e prestação de contas a sociedade.



4)     Política de Valorização do Trabalhador da Saúde

A precarização do trabalho em saúde tem um forte rebatimento na qualidade dos serviços prestados à população usuária do SUS, visto que os serviços de saúde não se realizam sem o trabalho humano em todas suas dimensões.
Entende-se que o processo de precarização dos serviços de saúde acontece em similitude com o processo de precarização do trabalho em saúde. Daí a importância das lutas contra retrocessos nas conquistas dos trabalhadores da saúde (salários justos com isonomia, estabilidade, vínculos sem precarização, condições de trabalho, jornada não exaustiva, vínculo único). A luta na saúde implica lutar por condições dignas de trabalho.

Problemas
·         Precarização do trabalho, terceirização dos trabalhadores da saúde, e ausência de incentivo ao profissional.
·         Processo de trabalho desarticulado, dificultando a participação consciente e crítica, desestimulando a responsabilidade, e inibindo o exercício da criatividade.
·         Baixos salários e ausência de incentivos relacionados a carreira dentro do setor estatal.
·         Ausência de política de garantia de oferta de profissionais de saúde em regiões distantes e periferias de grandes metrópoles.

Propostas
  • Avançar na gestão do trabalho em saúde, tendo como foco a ampliação da estabilidade, do vínculo, da satisfação e do compromisso dos trabalhadores com o Sistema Único de Saúde:
a)      Remuneração e incentivos (Planos de Carreira, Cargos e Salários para o SUS) sem os limites da Lei de Responsabilidade Fiscal sobre a realização de concursos públicos.
b)      Organização do processo de trabalho (ênfase no trabalho interdisciplinar, participação dos trabalhadores na gestão, melhoria das condições de trabalho e cuidado com a saúde do trabalhador).
c)      Educação permanente dos trabalhadores de saúde com a participação dos mesmos no processo de articulação entre as unidades de formação e os serviços.
d)      Redução das iniqüidades na alocação e fixação dos trabalhadores entre as regiões do país.
  • Implementação de uma política de recursos humanos que considere a admissão dos trabalhadores por concurso público, a isonomia salarial, a estabilidade do trabalho, os Planos de Cargos, Carreiras e Salários (PCCS) para os trabalhadores de saúde e a qualificação profissional.
  • Estabelecimento de diretrizes para a formação em saúde voltada para o interesse público, reorientação dos currículos de ensino para as profissões de saúde, estabelecer critérios para os novos cursos na área da saúde. Defesa do ensino público, gratuito e de qualidade.

5)     Efetivação do Controle Social

Observa-se que os espaços institucionais de controle social – Conselhos e Conferências – apesar de serem fruto de conquistas sociais, têm se tornado, muitas vezes, espaços de cooptação de lideranças e movimentos sociais, passando a ser controlados pelos gestores. Permanece o desafio de torná-los espaços de disputa para a efetivação do direito universal à saúde e para a defesa da saúde pública estatal.
A experiência recente dos Fóruns estaduais de saúde e da Frente Nacional contra a Privatização tem aberto a possibilidade de fortalecer também espaços não institucionais de controle social, bem como fortalecer os usuários e trabalhadores da saúde nas suas lutas nos conselhos. O principal neste processo é a autonomia e independência dos movimentos sociais e sindicais perante qualquer gestão e a firmeza na defesa do SUS público, estatal e de qualidade.

Problemas
·         Não cumprimento das deliberações dos conselhos e conferências de saúde.

Propostas
  • Fortalecimento do Controle Social na Saúde articulado com os movimentos sociais. Os conselhos precisam exigir dos gestores o cumprimento das decisões das conferências de saúde e ampliar seus vínculos com os movimentos sociais. A participação dos sujeitos sociais só será efetiva com um amplo trabalho de socialização das informações para que ocorra intervenção qualificada no sentido de exigir direitos e pressionar o poder público.
  • Ampliação da gestão participativa e da regulação externa e democrática do sistema público de saúde, articulando com o Ministério Público e outros órgãos /instâncias de representação popular não ligados diretamente à saúde.
  • Fortalecimento da autonomia e independência dos movimentos sociais nos espaços de controle social, perante a gestão do SUS, nas três esferas de governo.
  • Incentivo à criação de espaços autônomos de controle social como os Fóruns de Saúde nos estados e seus núcleos nos municípios.
  • Articular os conselhos de saúde com os das demais políticas sociais, formando uma agenda única para o enfrentamento da questão social.

A defesa da saúde, como melhores condições de vida e trabalho, tem que ser fruto da luta unificada dos segmentos das classes dominadas, articulada com os conselhos, movimentos sociais, partidos políticos, e outros, para avançar na radicalização da democracia social, econômica e política.
Fiéis aos princípios da Reforma Sanitária brasileira que concebeu a saúde como bem público, a Frente se posiciona contra a privatização da saúde e em defesa da saúde pública, estatal, de qualidade e universal, procurando articular as lutas no campo da saúde a um novo projeto societário. Enfatiza, parafraseando Berlinguer (1978), que para se ter saúde é necessário “modificar as condições de vida, as relações de trabalho, as estruturas civis da cidade e do campo, significa lesar interesses poderosos e olhar com audácia para o futuro.”



[1] Agenda com base inicialmente, no documento “Política de Saúde na Atual Conjuntura: Modelos de Gestão e Agenda para a Saúde”. 2. ed. Rio de Janeiro: Rede Sirius/Adufrj-SSind, 2008, e ampliada nos dois Seminários Nacionais realizados pela Frente Nacional contra a Privatização da Saúde em 2010, no Rio de Janeiro e em 2011, em São Paulo.

[2] ABEPSS (Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social); ANDES-SN (Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior); ASFOC-SN (Sindicato dos Trabalhadores da FIOCRUZ); CMP (Central de Movimentos Populares); CFESS (Conselho Federal de Serviço Social); CSP-CONLUTAS (Central Sindical e Popular); CTB (Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil); Executiva Nacional dos Estudantes de Medicina, Enfermagem e Serviço Social; FASUBRA (Federação dos Sindicatos dos Trabalhadores das Universidades Públicas Brasileiras); FENASPS (Federação Nacional dos Sindicatos de Trabalhadores em Saúde, Trabalho, Previdência e Assistência Social); FENTAS (Fórum das Entidades Nacionais de Trabalhadores da Área da Saúde); Fórum Nacional de Residentes; Intersindical (Instrumento de Luta e Organização da Classe Trabalhadora e Instrumento de Luta, Unidade da Classe e de Construção de uma Central); MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra); Seminário Livre pela Saúde; os Fóruns de Saúde já existentes (Rio de Janeiro, Alagoas, São Paulo, Paraná, Londrina, Rio Grande do Norte, Distrito Federal, Pernambuco, Minas Gerais, Ceará, Rio Grande do Sul, Paraíba); os setoriais e/ou núcleos dos partidos políticos (PSOL, PCB, PSTU, PT e PC do B); Consulta Popular e projetos universitários (UERJ – Universidade do Estado do Rio de Janeiro; UFRJ – Universidade Federal do Rio de Janeiro; UFF – Universidade Federal Fluminense; UFAL – Universidade Federal de Alagoas; UEL – Universidade Estadual de Londrina; EPSJV/FIOCRUZ – Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio da FIOCRUZ; CESTEH/ENSP/FIOCRUZ - Centro de Estudos da Saúde do Trabalhador e Ecologia Humana da Escola Nacional de Saúde da FIOCRUZ; UFPB – Universidade Federal da Paraíba; USP- Universidade de São Paulo).
[3] Muitas proposições defendidas nos seminários têm como referência a Carta de Brasília, fruto do 8° Simpósio sobre Política Nacional de Saúde, realizado em junho de 2005, com a participação de mais de oitocentos integrantes.

Documentos apresentados na XIª Conferencia Municipal de Belo Horizonte


Financiamento e EC29
É recorrente ouvirmos que falta dinheiro para a saúde. É verdade! As verbas destinadas ao setor são insuficientes para as demandas. No Brasil se aplica muito pouco por pessoa na saúde. Além disso, os recursos financeiros, tecnológicos e humanos são concentrados nos grandes centros urbanos.
As conquistas da Constituição de 1988, no que se refere aos direitos coletivos, vem sistematicamente sofrendo perdas importantes  com relação ao financiamento e garantias individuais, principalmente da parcela mais pobre da população. Essa situação envolve especialmente a seguridade social que definiu mais investimentos na saúde, previdência, assistência social e seguro desemprego A ofensiva contra esses direitos passa pela redução de investimentos, pela concessões fiscais a grandes setores empresariais e pela proposta de reforma tributária em curso.
O Manifesto em defesa dos direitos sociais básicos sobre a Reforma Tributária afirma “O projeto de reforma, sob o manto da simplificação tributária, extingue as contribuições sociais e incorpora esses recursos a impostos. A Seguridade Social perderia as fontes vinculadas e uso exclusivo, em troca da receita de uma fração da arrecadação. Assim as políticas sociais deixariam de contar com recursos exclusivos e passariam a disputar no bolo do orçamento fiscal recursos com os governadores e prefeitos, Forças Armadas e dos Poderes, enfrentando ainda forte pressão de setores empresariais pelo aumento dos gastos com investimentos em infra-estrutura ou por maior desoneração tributária.”
O país gasta mais com juros do que com a seguridade social, veja no gráfico abaixo a distribuição dos recursos públicos.
Cálculo feito pela Auditoria Cidadã da Divida revela que com os bilhões sugados pela especulação, seria possível, “construir 20 milhões de casas populares, contratar por um ano 2 milhões e meio de médicos ganhando 10 mil reais ao mês, ou ainda aumentar o salário mínimo dos atuais  545 reais para 2.660 reais”.
Aliado às constantes perdas de recursos da área da saúde, há outros dados que nos deixam perplexos, como o mercado de planos e seguros de saúde privados que hoje chega a cerca de 30% da população, recebe enormes benefícios do poder público, como isenções fiscais e estão entre os setores que obtém as maiores taxas de lucro, movimentam hoje valor semelhante aos recursos do SUS, tendo apenas 1/3 do mercado. Os planos não atuam naquelas áreas consideradas não lucrativas e acabam empurrando parcela dos seus clientes para o SUS. Isto é evidente nos atendimentos de HIV/AIDS, Hemodialise e Exames nos grandes centros. Há também o caso de gestores, e são muitos, que trabalham nos dois sistemas e se utilizam disso para “economizar” para os planos em que trabalham.
Criada há mais de 10 anos a Ec29 ainda não foi regulamentada. Recentemente veio a publico, que a mesma será colocada em pauta para regulamentação. Na última década foram realizadas várias investidas contra os recursos da saúde. Acabaram com a CPMF, falam em criar outros impostos, mas a realidade é uma só, aumentam as demandas e reivindicações da população por serviços de melhor qualidade e os governos não cumprem sequer o mínimo.
A regulamentação da EC 29 quando foi criada, poderia significar muito para saúde, mas diante de tantos desmandos, os percentuais propostos originalmente certamente não terão o mesmo efeito, pois com as anistias, reforma tributária proposta, a repentina vontade do governo de colocá-la em votação no Congresso tem outros objetivos.
Veja em exemplo, a situação hipotética de 2 orçamentos familiares:
Uma família que tem um rendimento de 10 mil reais anuais e fosse aplicar um percentual de 10% para cuidar da sua saúde, aplicaria 1 mil reais.
Se uma outra família com 20 mil reais de rendimento e aplicasse os mesmos 10%, aplicaria neste caso 2 mil reais.
As duas famílias aplicam o mesmo percentual de 10%, no entanto, o montante aplicado é diferente, e certamente a família com 2 mil reais pode cuidar melhor da sua saúde.
Este é o caso da EC29, ela determina os percentuais de 10% do Orçamento Federal, 12% dos Orçamentos Estaduais e 15% dos Orçamentos Municipais. No entanto se estes percentuais forem aplicados em orçamentos pequenos, os recursos para saúde não aumentarão como todos avaliam.
Portanto defender a EC29 apenas não basta, é necessário defender também aumento real no montante dos recursos destinados à saúde.
- Devemos exigir o fim da Renuncia Fiscal para Pessoa Juridica
- Exigir que os Planos paguem pelos serviços realizados por seus clientes no SUS.
- Por uma Reforma Tributária que amplie os recursos para a Seguridade Social.

Recursos Humanos
As áreas da saúde e educação são movidas essencialmente por seus profissionais. Podemos ter uma linda escola, mas se nela não tiver professores bem formados com condições dignas de trabalho, certamente o ensino também não terá qualidade. Na saúde é a mesma coisa, precisamos ter agentes comunitários, técnicos, enfermeiros, médicos, dentistas, psicólogos, etc, capacitados, remunerados com mínimo de dignidade e condições de trabalho que lhes permitam desenvolver um bom trabalho.
Atualmente, os governos desenvolvem políticas que não valorizam os seus profissionais, os mesmos são submetidos à longas jornadas de trabalho, à falta de estrutura das unidades, falta de medicamentos e instrumentos para as atividades e não possuem salários compatíveis com o trabalho.
A solução do governo de BH é vergonhosa, quer resolver um problema importante para os serviços com a contratação de estagiários, “Posso Ajudar”, e outras meios precarizados de contratação.
Para que se tenha o mínimo de qualidade dos serviços prestados à população é preciso que implante os Principios e Diretrizes definidos pelo SUS para os Recursos Humanos, com:
Contratação apenas por Concurso Público e Jornada de no máximo 30 horas.
Uma política de formação e profissionalização permanente e continuada para o conjunto dos trabalhadores do SUS.
Eliminação das contratações precárias e Criação das Carreiras e Salários para os trabalhadores do SUS, incluindo nestes Planos os cargos de coordenação e direção, recrutados sempre entre os profissionais da área.

Privatização e PPPs
O discurso da eficiência e melhoria dos serviços está presente na maioria dos pronunciamentos dos governantes, no entanto, eles não correspondem à prática. As formas adotadas para se buscar a “eficiência” impõem a precarização e descontinuidade dos serviços. A terceirização foi uma dessas primeiras formas, serviu para precarizar as relações de trabalho, promover a piora nos salários e nas condições de trabalho nos serviços públicos e privados.
Hoje, a terceirização da contratação de trabalho no setor da saúde vai além dos serviços gerais de limpeza, vigilância e manutenção, atinge também os serviços profissionais e técnicos de saúde.
Com a terceirização, o SUS perde, há o repasse do patrimônio, bens, serviços, servidores e dotação orçamentária  a empresas de direito privado. Há desprofissionalização dos serviços, dos servidores e desorganização do processo de trabalho em saúde. Nos setores terceirizados não há o mínimo de controle social.
Avança também na saúde as OS's (Organizações Sociais) e as OSCIP's (Organizações da Sociedade Civil de Interesse Publico). Essas apesar de terem regulamentação, exercem os mesmos danos ao Sistema que a terceirização, pois lhes são entregues bens móveis, recursos humanos e financeiros, dando lhes autonomia  para contratar, comprar sem licitação, autorgando-lhes mandato para gerenciamento, execução e prestação de serviços públicos de saúde, sem se preservar a legislação sobre a administração pública e os princípios e diretrizes do SUS.
Com as OS's e OSCIP's, os serviços públicos ficam completamente vulneráveis, com o fim dos investimentos, concurso publico e os direitos fundamentais conquistados pela população.
As PPP's, apontam no mesmo caminho, colocar os serviços públicos na mão de setores privados. Neste caso mais danos para a população, pois já pressupõe o lucro como fonte de compensação para as empresas que se dispuserem a gerir os serviços.
De tão danoso para a população, a administração de BH, vem resistindo a mostrar dados e discutir abertamente o que significam as PPP's na saúde, apenas fazem a propaganda de que tudo será lindo e maravilhoso e todos terão atendimento de primeiro mundo. Já tivemos em outros momentos no país, essas falsas propagandas. Quem não se lembra da época da privatização das telecomunicações, diziam que teríamos um telefone em cada casa e um orelhão em cada esquina. Depois de anos se mantém a tarifa básica, os orelhões praticamente inexistem e vendem para a população o celular com as tarifas mais caras do mundo.
Outro fato importante foi denunciado recentemente, sobre as PPP's para construção dos Estádios da Copa. Cerca de 85% do custo das obras será com dinheiro publico. Portando, as empresas irão investir muito pouco, mas ficarão com os direitos de administrar os Estádios por longos períodos e com isso obter enormes lucros.
PPP's, OSCIP's e semelhantes, colocam mais combustível na corrupção nos serviços públicos. Recentemente veio a público o comercio de OSCIP's, elas eram vendidas por até 20 mil reais, conforme consta nos processos e denúncias.
A melhor alternativa para a melhoria dos serviços de saúde é mais investimentos em estrutura, pessoal e controle social.

Controle Social
Participar, decidir e ajudar a construir o SUS foram os pilares da discussão do papel dos Conselhos de Saúde. Com o passar do tempo os governos municipais ficaram inconformados com o trabalho de muitos conselheiros, que defendem a implementação e avanços para o SUS, bem como fiscalizam e denunciam os mal feitores. Para impedir a ação dos Conselheiros, esses governantes iniciaram dois movimentos: o primeiro de desqualificar o papel dos Conselhos e o segundo de cooptar a maioria dos Conselheiros para impor os seus planos sem serem incomodados.
Outras medidas também foram utilizadas para reduzir o papel dos Conselheiros. Onde foram implantadas as OSCIP’s, OS’s e mais recetente as PPP’s, a participação popular é inibida.
A recente regulamentação da Lei 8080, recoloca a importância da participação popular através dos Conselhos, mas a eficácia da mesma está diretamente ligada à capacidade dos Conselhos serem articulados e reafirmarem sua independência frente aos governos.
Os Conselhos Municipal e Locais de BH serviram de referencia para muitos outros Conselhos pelo interior, pela atuação de forma independente e pela procura, sempre, do melhor caminho para saúde da cidade.
Essa experiência precisa continuar e melhorar é, para isso, e preciso fortalecer e qualificar ainda mais o Conselho, com capacitação dos conselheiros em todos os níveis.
Formar os conselheiros permanentemente.
Melhorar o processo de informação para dar mais consistência às decisões.
Realizar um trabalho junto a população sobre a importância da participação popular nas instancias de Controle Social
Promover rodízio de Conselheiros, criando mecanismo que limitem o tempo de representação em cada instância.
Realizar debates permanentes com representantes da população, organizados em movimentos sociais, sindicais e autônomos, sobre os serviços de saúde em BH.

BH julho de 2011