quarta-feira, 23 de maio de 2012

PORQUE DEFENDER A LUTA ANTIMANICOMIAL?


Por Jarbas Vieira de Oliveira

         Primeiramente gostaria de agradecer ao PASME ( Programa de atenção á saúde mental na UFMG) na pessoa da Professora Doutura Maria Stella Brandão Goulart que fez o convite ao FOFO ( Fórum de Formação em Saúde mental)  e organiza essa atividade aqui na FAFICH, nosso muito obrigado. 
Segundamentegostaria de destacar o quão feliz estou por poder compartilhar dessa atividade com vocês. Ex aluno dessa universidade, lutei por anos a fio, para que o debate acerca da luta antimanicomial fosse uma proposta da Universidade e não apenas de guetos por ela espalhados. Os guetos possuem seus louros, mas também seus limites, porque não coletivizam o tema ao se trancarem em seus departamentos, mas pelo que vejo, o PASME é fruto desses guetos que agora se coletivizam e tornam o tema da Luta Antimanicomial uma prática debatida dentro desse universo do saber que é a UFMG. Maior que a maioria das cidades de MG e com um campo de ideologia marcadamente influenciável não somente em Minas, mas no Brasil.
            Feito os agradecimentos, vamos ao tema de hoje: POR QUE DEFENDER A LUTA ANTIMANICOMIAL? Essa pergunta é muito ampla e os presentes hão de me compreender que não poderemos terminar esse debate por aqui, mas dá um pontapé inicial, pois, esse tema é dos antigos, há mais de 40 anos.
            Vamos por partes como diz o Jack: 1) POR QUE: analisando essa palavra, ou como queiram esse conjunto de palavras, se não me falhe a memória gramatical é um advérbio interrogativo, onde ela se encontra mostra-se como um questionamento e se questionamos é porque ou não entendemos, ou não concordamos. Estou certo? 2) em segundo lugar DEFENDER é um verbo que perspectiviza a noção de que precisamos ser à favor de algo que a maioria não é, por isso defendemos. Defender alguma coisa ou alguém é porque temos a certeza de que essa coisa ou pessoa é frágil e que mesmo que ela esteja se fortificando precisa de ser defendida. 3) por fim e não menos importante LUTA  ANTIMANICOMIAL. São um conjunto de duas palavras que sozinhas representam muito e juntas mais ainda. LUTA vem do verbo lutar, que para mim é sinônimo de apoiar, defender, brigar, guerrear em favor de algo ou de alguém. ANTIMANICOMIAL vem de uma flexão de negação entre uma palavra que a maioria já é a favor (hj nem tanto, no sentido estrito da palavra) MANICOMIAL e o prefixo de negação ANTI na qual estamos aqui, debatendo.
            Realizado essa guisa de introdução, remeto-me aos demais com alguns questionamentos: POR QUE VOCÊS (NÓS) ESTÃO (MOS) AQUI?; O QUE ESSE TEMA TEM A VER CONOSCO? O QUE SIGNIFICA ISSO PARA NÓS PRESENTES NO AUDITÓRIO PROFESSOR BICALHO (que só sei que foi um professor emérito aqui na FAFICH)?
Defendemos a luta antimanicomial porque sabemos que ela ainda precisa de ser defendida, lutada, guerreada. Precisa de sangue novo nos olhos da juventude que ao sair dessa e de todas as universidades do pais irão em sua maioria trabalhar em um serviço substitutivo. Muitos de vocês aqui presentes não passaram por um hospital psiquiátrico, ou no máximo, como eu, fizeram uma ou outra visita e se assim for, puderam presenciar o horror que aquilo, eu digo isso, AQUILO pode representar na sociedade como hoje. Os hospitais psiquiátricos, tanto em Trisete como aqui no Brasil, não necessitam de existir, porque criamos algo novo, criamos algo que o substituta, criamos os serviços territorializados, onde os usuários, vão e vem todos os dias e onde aqueles que por um curtíssimo período de tempo não podendo ir e vir, podem ser acolhidos, respeitosamente nesses serviços e ultrapassarem o momento de suas crises ali mesmo, mas com respeito cidadão, com dignidade e não dormindo em colchões de gramas, matos, ali mesmo no chão do hospital. Hoje, os defensores dos manicômios, dizem que os hospitais estão humanizados. Ora, como assim humanizados? Quais os conceitos de humanos damos para esses lugares? O fato de não terem leitos em chão de matos, não comerem no chão e não viverem pelados pelos pátios afora, à revelia, quer dizer que são humanizados? Onde estão o humano que não tem liberdade? A Liberdade também faz parte da constituição do ser humano, ou não? Me corrijam se estiver errado, ou discordem de mim, se for o caso.
            Defendemos sim a LUTA ANTIMANICOMIAL porque sabemos que mudou os serviços mudaram, mas a formação ainda não. Ainda temos em diversos, para não dizer a maioria, cursos que insistem na apresentação psicopatológica que vão aos hospitais para aprenderem e nada apreenderem daquele lugar e fazer dos usuários meros bonecos de aprendizagem.
            Defendemos a LUTA ANTIMANICOMIAL porque sabemos que a ideologia do encarceramento está no dia a dia, na cabeça das pessoas e a lógica tutelar ainda reside em nossas ações e que por isso, precisamos à todo momento saber o que fazemos e para quem e por quem fazemos tal clinica.
            Você daria o mesmo tratamento que seu serviço costuma dar para um familiar próximo, tipo pai ou mãe? Eu sim. Se não, porque não mudarmos isso, porque não revertermos a ideologia e ao invés de apenas quebramos os muros, não mudarmos nossos costumes. A tutela não está apenas nos hospitais psiquiátricos assim como não está apenas na saúde mental e por isso, devemos estar- SE OPTARMOS É CLARO- sempre pensando em nossas ações e não realizarmos um tratamento que vai de encontro ao que falamos em mesas, que vai de encontro ao que o cidadão mereça, que vai de encontro ao que realmente seja humanizado.
            DEFENDEMOS A LUTA ANTIMANICOMIAL porque sabemos que a SOCIEDADE BRASILEIRA DE PSIQUIATRIA possui cadeira cativa nas universidades, nas câmaras municipais, estaduais e federais de todo o Brasil e está à todo momento querendo que os lutadores saiam desse lugar que eles ocupam e vão discutir política porque a clinica é pura, a clínica é neutra e faz parte de uma ciência e que por si também é neutra. O que de fato é neutro? Onde anda a neutralidade?
            Sabemos que se não DEFENDERMOS A LUTA ANTIMANICOMIAL poderemos cair no erro histórico de deixar os estudantes sendo formados pelos manicomiais e praticarem essa horrível atrocidade com os usuários que são em sua maioria, pobres, sujos, descalços, negros e loucos. Para piorar, só precisa serem presos, aí os trancamos em hospitais para que não nos incomodem.
            DEFENDEMOS A LUTA ANTIMANICOMIAL porque temos para nós o princípio de que a LIBERDADE É TERAPÊUTICA e que por isso, queremos os loucos nas ruas, tomando-as, cheirando-as, e vivendo-as de todas as formas, de todos os gestos em todos os dias e não apenas no dia 18 de maio onde comemoramos o DIA NACIONAL DA LUTA ANTIMANICOMIAL. Onde nele queremos celebrar o fim dos hospitais psiquiátricos com uma proposta muito mais saudável, colorida e terapêutica que hoje a chamamos de CAPS OU EM MINAS DE CERSAM’S que chamamos de CENTROS DE CONVIVÊNCIAS que chamamos de ATENÇÃO BÁSICA. Esse tripé de tratamento que  para nós é caro, para nós é simbólico e para nós é estatísticamente comprovado como sendo o melhor a se fazer por uma população que socialmente já é alijada de todos os processos de vida e que não seremos nós, trabalhadores da saúde que reforçaremos essa exclusão.
Por isso, o FOFO e os demais coletivos, movimentos e organizações políticas presentes aqui nesse auditório e em todo o Brasil conclamamos: BEM VINDOS AO MUNDO SEM MANICÔMIOS E SEM PRISÕES...
OBRIGADO

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